O Massacre das Galinhas

O número de galinhas abatidas no mundo representa 86% de todos os animais terrestres abatidos. Nos últimos 20 anos, o abate de galinhas deu um salto gigantesco, praticamente dobrando — passando de cerca de 47 bilhões no início dos anos 2000 para mais de 88 bilhões na atualidade (dados da FAO).

No Brasil, não é diferente. Além de ser o maior exportador de carne bovina do mundo, o país também é o maior exportador de carne de frango. Mesmo possuindo o maior rebanho bovino do planeta, 98% dos abates no Brasil são de galinhas — foram 6,4 bilhões em 2024, segundo o IBGE. O Brasil mata, em média, 12.453 galinhas por minuto, o que representa 17,8 milhões por dia! Em apenas dois dias, o país mata o mesmo número de galinhas que de vacas em um ano inteiro.

 

Como a indústria funciona:

Visando à lucratividade, a indústria busca reproduzir galinhas que cresçam o mais rápido possível com o mínimo de comida possível. Assim, através da seleção genética desses animais, criam animais cujos músculos e tecidos de gordura crescem bem mais do que seus ossos, levando a deformidades e doenças. Algo entre 1% e 4% dessas aves morrerá retorcendo-se em convulsões devido à síndrome da morte súbita, uma doença quase desconhecida fora das granjas de criação intensiva. Outra doença induzida pelas granjas industriais é a ascite, excesso de fluido que enche a cavidade corporal, que mata aproximadamente 5% das aves do mundo.

Três a cada quatro aves terão algum grau de defeito ao caminhar, e o senso comum sugere que sentem dor crônica. Uma a cada quatro terá tantos problemas ao caminhar que não há dúvidas de que sentirá dor.

Nos galpões, as luzes podem ficar acesas cerca de 24 horas por dia durante a primeira semana de vida dos pintos, mais ou menos. Isso os encoraja a comer mais. O tempo de luz artificial é então reduzido, dando-lhes cerca de 4 horas de escuridão por dia — sono suficiente para que sobrevivam.

É claro que as galinhas enlouquecem se forem obrigadas a viver em condições tão antinaturais por muito tempo — as luzes, o modo como ficam comprimidas e o fardo de seus corpos grotescos. Assim, os frangos “de corte”, em geral, são abatidos no 42º dia de vida ou mais cedo, de modo que não dá tempo de estabelecerem hierarquias e começarem a se matar lá dentro.

Desnecessário dizer que aves comprimidas, deformadas, drogadas e com estresse demais em um lugar fechado, imundo e forrado de excrementos não vivem em situação muito saudável.

Além das deformidades, danos aos olhos, cegueira, sangramentos internos, infecção bacteriana dos ossos, vértebras deslocadas, patas e pescoço tortos, doenças respiratórias e sistema imunológico enfraquecido são problemas frequentes e duradouros em granjas industriais. Estudos científicos e registros do governo sugerem que praticamente todas as galinhas (mais de 95%) acabam infectadas pela E. coli (um indicador de contaminação fecal), e entre 39 e 75% delas ainda continuarão infectadas na comercialização. Cerca de 8% das aves têm infecção por salmonela. Entre 70% e 90% são infectadas por outro patógeno potencialmente mortal, o campilobacter. Banhos de cloro são comumente usados para remover o muco, o odor e as bactérias.

Texto adaptado do livro “Comer Animais”, de Jonathan Safran Foer.

 

Quem lucra com tamanha exploração?

A criação e o abate de galinhas formam um dos setores mais lucrativos da pecuária global. Em 2025, o mercado mundial de carne de aves deve movimentar cerca de R$ 1.8 trilhões (US$ 336 bilhões), segundo a plataforma Statista. Já o mercado global de ovos foi avaliado em cerca de R$ 886 bilhões (US$ 165 bilhões) em 2025. Somados, esses números revelam uma indústria que fatura mais de 2.5 trilhões de reais ou meio trilhão de dólares por ano explorando galinhas para carne e ovos.

Grande parte desse dinheiro se concentra nas mãos de poucas corporações multinacionais que dominam toda a cadeia produtiva — desde a manipulação genética das aves até o abate e exportação. Entre elas estão JBS (Brasil), Tyson Foods (EUA), BRF (Brasil Foods, dona da Sadia e da Perdigão), CP Foods (Tailândia) e Cargill (EUA).

No Brasil, o setor avícola é amplamente sustentado por subsídios públicos, isenções fiscais e crédito rural subsidiado, o que significa que recursos públicos financiam uma indústria privada baseada na exploração animal. Segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), o país exportou 5.3 milhões de toneladas de carne de frango em 2024, gerando US$ 9,9 bilhões em receita. Enquanto isso, trabalhadores das granjas e abatedouros enfrentam baixa remuneração, longas jornadas e alto risco de acidentes, e os animais continuam a pagar o preço mais alto.

A carne de frango e os ovos “baratos” nas prateleiras só existem porque há uma estrutura industrial baseada no massacre animal e na externalização dos impactos ambientais e sociais, enquanto concentra o lucro nas mãos de poucos conglomerados internacionais.